Diariamente, um desafio é lançado: uma palavra, apenas uma, que seja capaz de mexer com a criatividade desses oito escritores. Eles deixam os dedos correr no teclado, livres e descomprometidos. O resultado? Uma poesia, uma crônica, um haikai, um conto... Enfim, o que a inspiração deixar. O blog é isso, um convite à criatividade, provocada todos os dias, no finalzinho do expediente.

terça-feira, 31 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É...CATAVENTO

Por Mariângela
Eu catei tudo....
as dores de outros,
amores que não tive,
paixões entaladas,
desejos enlatados,
perdas imperdoáveis,
medos homéricos,
altos obstáculos,
dias fáceis,
calor morno,
paz disfarçada,
preguiça e silêncio.
Ergui os pés,
o vento bateu na cara,
abri os braços,
e tudo ali larguei.
Foi quando, enfim, voei.
Por Gabriela
Já catei muito vento. E conchas do mar.
Porque as ondas nunca se deixaram aprisionar.
Tive esta ilusão de controlar o tempo, de ser dona de mim.
Estive em montanhas altas, vendo o mundo de cima.
Enfiada em buracos, mal vi luz.
Eu fui demais.
Eu guardo um par de coisas destas minhas andanças.
Um girassol, o tênis furado na ponta, uma camiseta rasgada.
O catavento puído, um texto amarelado, uma foto sem data ou memória.
Uma garrafa vazia, um brinco quebrado, um pé de meia sem par.
Não, não são tesouros de uma índole apegada. Testemunhas, só. Cúmplices no meu ir pelo mundo.

segunda-feira, 30 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... FÉ

Por Cleo
Eu digo sempre menos do que queria. Ou mais. Bem mais.
Um dia, exagero. No outro, peco pela falta.
Sorrio demais quando deveria ter dado mal e mal um sorrisinho fechado.
Choro de menos quando deveria ter me derramado em lágrimas.
Sou levemente boazinha quando deveria ter dado não só ombro, mas colo.
Dou amor quando não recebo, desapareço quando deveria estar, estou quando deveria me esconder.
Levo bronca por reafirmar para mim mesma que não fui feita para o amor. Eu não acredito nisso, mas afirmo. É uma espécie de defesa. Mas tem a maior cara de ataque. Contra mim mesma, é claro.
Apaixono-me mais depois que o amor já passou.
Corro atrás de quem não se deixa pegar.
Fujo a léguas de quem me persegue.
Às vezes, só às vezes, fico parada. Morro de pressa, mas espero acontecer.
Não procuro nada básico, nem roupa, nem relacionamento. Mas me perco na complexidade da vida, achando que deveria ter querido algo mais simples.
Procuro uma mão para segurar quando ela se esconde dentro de um bolso.
Fotografo paisagens vazias, sem cenas de mim. Aliás, nunca estou nas minhas fotos. Seguro demais a pose, mesmo sabendo que ela dura menos tempo do que um flash.
Quando eu quero que as coisas funcionem, elas dão pau. O secador de cabelo, a torradeira, as compras pela internet e a programação da TV a cabo. Tudo colapsa justamente naquele dia em que eu quero secar minha franja, comer torrada com cream cheese, fazer uma compra on line de um secador de cabelo novo (e o produto está indisponível no momento, embora eles insistam em querer me vender uma bicicleta ergométrica e o livro “O caçador de pipas”) e assistir às 20h00 o documentário sobre o New Kids on the Block (que passou às 19h00, embora a programação dissesse o contrário).
É no dia de Ano Novo que eu adoro o Natal.
Divirto-me com uma viagem quando já voltei para casa.
Adoro carne, mas morro de dó.
Sempre quero uma rasteirinha quando estou de salto.
Sempre quero o perfume cítrico quando resolvi sair de casa cheirando a tutifruti.
Não suporto exercícios físicos, mas não deixo de querer outra barriguinha no lugar da minha todo dia antes de dormir.
Tenho horror a fumante folgado, que bafora seu lixo no mundo e joga sua bituca escrota pela janela do carro. Mas não consigo, simplesmente não consigo querer parar de fumar.
Adoro qualquer tipo de manifestação artística. Sempre acho que levo jeito para todas e qualquer uma delas. Mas canto mal, desenho mal, pinto tão bem quanto uma maritaca, nunca aprendi a ler partituras, larguei a faculdade de Cinema no primeiro ano e escrevo achando que vou provocar delírios quando, no máximo - se o dia estiver bom - faço uma pessoa rir. Uma. Geralmente minha mãe.
Sou fascinada pelos mistérios do universo. Queria ter sido astrônoma, astrobióloga, qualquer coisa que começasse com astro e oferecesse um cargo na NASA. Mas nunca tirei nota maior do que 6,0 nas provas de ótica. Odiava mecânica. E enforquei todas, eu disse TODAS as aulas de eletricidade quando me preparava para o vestibular. Não faço ideia do que seja um ampere. Afinal, para que eu precisava dessa porcaria toda se queria estudar... Cinema, certo?
Amei um milhão de vezes para sempre.
Terminei namoros que, jurei, jamais teriam fim.
Já quis estar em todos os lugares do mundo sem precisar sair da minha casa.
Se está curto, quero comprido. Se liso, enrolado.
Se sozinha, preocupada. Se acompanhada, magrela.
Eu sei tirar cutícula da mão direita, mas não sei imprimir etiquetas Pimaco 6182.
Eu sei cuidar de cachorro, mas preciso aprender a aceitar algumas coisas, algumas pessoas e alguns lugares como eles são. Preciso muito aprender a parar de imaginar “como seria se”.
E assim eu sigo.
Às vezes, dizendo mais do que queria.
Outras vezes, seja por excesso de amor à arte (que eu não domino) ou por falta de amor a mim mesma (que eu mal entendo), acabo dizendo menos.
E aí, quero acreditar em mim. Em você. Em qualquer coisa.
Quero acreditar...
Quando sei o que me dá mais prazer nessa vida é duvidar de tudo.
Por Gabriela
Veio feito um fogo manso no começo.
Queimava mas ainda não era labareda.
Ardia, mas era só brasa.
Não pediu comprovação, não exigiu sacrifício.
Aceitação, um morno de saber o peito aberto e sossegado.
Nem reza, nem sermão, nem dogma, nem ouro.
Não era a palavra, tampouco o cerimonial. Nada que coubesse nos olhos.
Era só a vaga sensação por dentro, de fogo que não queima.
Fé.
Por Mariângela
Juro que vou acreditar,
mas não me peça um "pra sempre"
porque minha fé tem validade.
Ela permanece inabalável
conforme o tamanho do seu sorriso
ou o calor que teu beijo me traz.
Por isso, veja só a responsabilidade:
meu credo é o seu comigo estar.
Por Sócrates
Fé no Neruda.
Na terra, na beleza, no amor.
No sabor do pão sem fermento.
No pão judeu, cristão, muçulmano, hindu, budista e do candomblé.
Ode ao pão.
Fé no Saramago.
No sangue dos fracos
Na palavra, na letra, na oralidade escrita com sangue.
Fé no que virá.
Na vida, no Gonzaguinha e na teologia da libertação.
Fé no Drummond.
Na inocência do Leblon.
Na páscoa sem ovos, sem coelhos, sem dinheiro.
Sem navio negreiro
Fé no Galeano
Na América Latina de Gabriel Garcia Marquez, Simon Bolivar e Che.
Fé no pão e no vinho
Ode ao vinho
do dia
da noite
De copos que não cabem
Na páscoa sem manjedoura
Sem sangue, apenas vinho e pão.

Fé II
Uma senhora de roupas brancas e cabelos grisalhos distribuia sopa na praça.
O Largo do Caranguejo era como um moredouro de pobres.
Aviltavam-se sobre as mãos solidárias da mulher,
que servia na porta da igreja o pão negado pelo padre.
No entorno homens bebiam cerveja, como se fosse vinho. As mulheres passavam como se fossem leprosos a deriva.
O som alto dos carros trocavam diálogo com as palavras do palco, que enceneva a paixão de Cristo. A senhora de roupas brancas pouco a pouco perdia as forças e se via entre as mãos e braços esfomeados. Cristo estava na cruz, enquanto o soldado lhe feria com a lança. A pobre mulher era sucumbida pela fome, enquanto o padre rezava a missa.
O pão viraria mão, o vinho sangue.
E o caranguejo comia os restos deixados na praça.

sexta-feira, 27 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... SEXTA-FEIRA

Por Gabriela
Sempre começo, sempre final.
Termina a semana, sai de nossos ombros o cansaço dos dias duros, trabalhados de sol a sol (ainda que ao abrigo do ar condicionado).
Começa o descanso, as perspectivas de.
De fazer sol, de pegar a estrada, de ir pra praia ou pro sítio, de pegar piscina, de fazer churrasco, de lavar o carro, de almoçar fora, de reunir a família, de dormir até tarde, de ir ao cabeleireiro, pegar um cinema, sair pra dançar, ver um lançamento no Telecine, jogar tênis, convidar um amigo pra bater papo em casa, andar pelo bairro a pé, andar pelo shopping, fazer um almoçozinho diferente, demorar pra sair da cama, tirar uma soneca depois do almoço, tomar umas cervejas no boteco da esquina, ler uma revista, terminar aquele livro, tomar café na padaria, fazer a lição de casa do curso de espanhol, planejar o futuro, ter tempo de uns muitos sonhos.
Sempre começo, sexta-feira.
Por Mariângela
Não sei pra que uma semana inteira
se a farra só começa na sexta-feira!
E por que 39 anos, se a vida só tem sentido pós os 40?
Ou pra que sofrer tantos amores frustrados
se você me aparece do nada, nem diz seu nome,
arranca de meu peito todo o cansaço
e enche o vazio com bolhas coloridas de sabão?
Não era mais fácil te ter primeiro, numa sexta-feira,
no auge dos meus 40 anos? Não era?
Vai entender...

quinta-feira, 26 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... PARANOIA

Por Mariângela
Bem me quer,
mal me quer,
bem me quer,
mal me quer...

E foi assim que surgiu
a paranoia no amor.
Por Cristina
Então, eu me lembro, foi daquela ultima vez que fomos à praia.
Não foi não, que mania de achar que sempre sabe quando e como as coisas aconteceram. Não foi daquela vez!
Ta bom, então não foi, nem ligo! O importante é que aconteceu, não importa quando.
Pronto, já esta querendo colocar o peso em mim de novo? Querendo a toda hora me lembrar que eu disse, que eu fiz... e você? Não fez nada?
Mas foi você quem me perguntou quando tinha acontecido!!! Eu já nem me lembrava do fato!
Não se lembrava? Mas não foi logo dizendo que dia tinha sido, aliás, inventando o dia do acontecimento? Deve ter se lembrado disso milhões de vezes e é claro, só me recriminando!
Mas que bobagem essa conversa, vamos mudar de assunto!
Tá vendo? Quando a coisa vira paro seu lado, já nem quer mais conversar. É assim que você faz!!!
Tá bom. Fala logo. Qual é o problema? Porque se não há um problema você sem duvida esta querendo arrumar um.
Por que? Você está querendo dizer que eu SEMPRE arrumo problemas?
Eu falei a palavra “sempre”? Falei?
Se não falou com certeza pensou, eu vi a expressão do seu rosto, pensa que eu não vi?
Eu acho que vou sair um pouco, isso aqui não está me cheirando bem...
Ah, então era isso que você queria não é? Sair!!! Agora sim deu para perceber o intuito, desde o começo. Você queria sair e arrumou essa conversa só para ter motivos para sair sozinha. Vamos lá, diga logo quem é ele.
Ele? Que ele? Você está maluco?
Viu? Estava faltando me chamar de maluco!!!! Era aí que você queria chegar!Bem aí! Saia então, vai, encontre-se com ele, quero ver se vai dar alguma coisa muito melhor do que esse inferno em que a gente vive.
A gente vive em um inferno? Vive?
Vive. A gente vive um inferno diário.
Ah! Agora percebi!!! Era aí que você queria chegar! Aposto que já não agüenta mais.
Isso mesmo! Não agüento mais.
Você está maluco? Desde quando você inventou isso? O que está acontecendo?
Nada! Então não está acontecendo nada? Só eu que acho? E eu é que sou o maluco? Então eu sou o completamente maluco? É isso que você queria me dizer?Então eu vou-me embora, é isso que você quer?
Eu? Eu falei que era isso que eu queria?
Bateu a porta e não voltou nunca mais.
Por Gabriela
- Não, não é um complô contra você!
- Claro que ninguém fez de propósito pra te magoar, acho que ele nem seu deu conta que você ficou chateada.
- Ah não, não acredito que alguém em sã consciência faça joguinhos deliberadamente pra te atingir! Não acha que está exagerando um pouquinho?
- Pára de imaginar coisas! Pra mim, é um pouco de paranóia da sua parte – ele seria muito maquiavélico se pensasse em algo assim, e os homens são bem mais racionais do que isso.
- Olha, você ficar se martirizando deste jeito não vai adiantar nada! Esquece isso, relaxa!
- Pode ser o maior lugar comum do mundo, mas você não precisa de um homem pra ser feliz.
- Enquanto você não focar em outras coisas e deixar de lado esta fixação em arranjar alguém, nada vai acontecer. Vai por mim!
- Não acredito que você ligou pra ele de novo??!! Ele não disse que ligava? E você já atropelou de novo??...
- Se quer que ele saiba de alguma coisa, seja direta. Estas mensagens dúbias enchem o saco e dão margem à interpretação que ele quiser. Depois não reclama.
- Quer saber de uma coisa?! O mundo não gira ao redor do seu umbigo! Deixa de ser egocêntrica! Cresça!

quarta-feira, 25 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... SIMULACRO

Por Gabriela
Há sim, estas cascas. Simulacros.
Inteira, quase nunca deixo me ver. E pra alguns muito poucos.
Justamente pra não ser falsa, pra abandonar de vez as máscaras que, por muito, usei.
Eu me embalo em alguns tecidos, véus e cores, mas sou mesma – sempre. Pode ter certeza.
Se te sorrio, é sorriso. Se te beijo, amor. Não há muita surpresa, mas toda verdade.
Não me espere carinhos mornos e disfarçados. Não me espere dulcíssima. Não sou eu.
Me respeite e aceite que te devolvo o mesmo.
E seu eu for, não me procure.
Por Mariângela
No meu altar tem um simulacro.
Sou eu pagã, em vestes negras.
Olho no espelho e me convenço
de que só eu assim me vejo,
enquanto todos, tão cegos,
não me percebem essa.
O que vêem é uma outra,
porque insistem, me inventam.
A outra em mim odeio.
A outra é que tanto amam.
Da outra quero me livrar.
Por Cristina
Apesar do sol que entrava pela janela, sentia frio. Na poltrona, corpo magro, cigarro abandonado na mão direita, olhar perdido, era um daqueles dias (como se chamavam mesmo? Dias brancos? Dias neutros? Dias nada?), Em que nenhum sentimento parecia se fazer presente e somente o abandono tomava conta de tudo. Som baixinho escutava Ruth com Egberto Gismonti, nome que o fazia lembrar outros nomes já tão longínquos, nomes que se haviam tornado um tão pouco, um quase nada, idos, findos, vez em quando ainda re-mexiam, re-moviam vácuos de tempo e, sobretudo re-feriam o corpo todo que passava a doer e traziam de volta o sentimento escondido em pensamentos que acreditava imbuídos no nada pensar, e causavam toda a re-viravolta dolorida e então vinha maldosamente o som de Ella Fitzgerald com o “Mean to me”, can’t-you-see-what-you-mean-to-me?
Levantou-se, apagou o cigarro e fez um café. Lembrou-se dela sentada na mesinha redonda, pronta para trabalhar, tomando café com ele, lágrima escorrendo na face, ela não gostava de ir embora, mas mesmo assim ia e sempre teimava em não voltar porque era mulher de sentimentos que de tão profundos ficavam leves demais. Ele nunca entendera como sentimentos podem ser assim, como um rufar de vento e foi então que se deu conta do vento que fazia a janela bater de levinho, apesar do sol (a mulher dos sentimentos de vento cismava em não gostar de vento e sempre fechava as janelas, mas gostava de olhar o mundo através dos vidros principalmente quando havia sol).
Daquela janela ele lhe mostrara as árvores, os caminhos que percorria todos os dias e lembrava-se de um (a musica era Luna Rossa com Caetano Veloso - porque sempre havia uma musica), em que olhando pela janela haviam conversado muito com as taças de vinho na mão e anoitecera, depois amanhecera e quase anoitecera de novo, a musica se repetindo ao longe (ele gostava de musica ao longe) e haviam adormecido no sofá, copos no chão.
Respirou fundo e as viu chegar, uma a uma, as andorinhas, pousando no parapeito da janela, olhando para ele (ah Luna Rossa!), acreditou que eram as mesmas daquele dia em que ele dissera olha, olha, vieram te ver, ela sorrira abrira a janela bem devagarinho, estendera a mão, ela queria encostar seu rosto, quase conseguiu, uma mansinha chegou bem pertinho do rosto dos dois, roçou a asinha, as peninhas azuis tocando nas faces enquanto de tão emocionados cada um derramava uma lágrima alegre e se abraçavam vendo a andorinha voar e sabiam que nunca mais esse dia seria esquecido e então escutou Ella Fitzgerald que teimava em machucar e cantava “when your love has gone”.
Sentou-se na poltrona, acendeu um cigarro e voltou ao seu dia como se chamava mesmo? Dia branco? Dia neutro? Dia nada?

segunda-feira, 23 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É...ÊXODO

Por Gabriela
Saíram de mim as chances todas de brotar.
Nem só aridez. Nem só descaso.
Houve ameaças de verde, suspeitas de colheita, embriões de frutos.
Vãos.
Tempo demais sem ver água, tempo de sobra pra murchar, fenecer.
Que vida é essa? Qual sina...
Lanço-me a este êxodo mas marcho sem vontade ou esperança ou corpo.
O que abandono já não sou há tempo demais.
E aonde ir não faz a menor diferença agora.
Por Cristina
Sentavam-se todos na mesma sala e na maioria das vezes nada diziam. Mas voltavam sempre, porque ali sentiam-se flutuar.
Ela preferia a musica bem alta. Gostava dos acordes que pareciam penetrar seu corpo, faziam tremer sua pele, tomavam todos os seus sentimentos.
O que gostava mesmo era de escutar e não pensar em mais nada. Só na musica, deixando que os caminhos da mente percorressem o que os acordes ditassem. E como percorriam!
Deixava-se ir pelos atalhos, pelas avenidas, pelos becos e os sentimentos iam tomando conta, um de cada vez. Não raro as lágrimas escorriam, o coração disparava, sentia dor profunda e quantas vezes jubilo, um jubilo que extrapolava e então levantava-se e dançava, dançava, olhos fechados, par imaginário ou nenhum, dançando, deixando a musica conduzir.
Nem via que havia outros ali. Provavelmente nenhum se via, todos levados pela musica que delicia que era juntar pessoas que gostavam da mesma coisa e podiam ficar assim lado a lado fazendo juntos o que cada um fazia por si só.
Quando a musica parava olhavam-se, olhos de lágrimas, olhos sorrindo, olhos tristes, olhos opacos, olhos nada, fosse o que fosse, sentiam-se todos mais irmãos. Às vezes conversavam ou apenas se tocavam e sorriam no silencio enquanto alguém colocava outra musica, às vezes só se olhavam e nada mais era necessário porque sabiam que se entendiam e sabiam que estavam juntos porque comungavam aquela entrega à musica e sabiam que seguiriam aonde a musica os levasse, todos no mesmo caminho, indo sempre para longe, cada vez mais longe, sabendo que iriam para sempre juntos, em êxodo.
Por Mariângela
Por que será que você saiu de mim?
Não quis mais explorar meus vales,
nem deitar na minha sombra morna
ou dormir na relva de meus pêlos pubianos.
Deixou para trás os campos que cultivamos juntos
entre as cobertas e sob o céu que pintei no nosso teto.
Por que me negas como se eu fosse uma terra estranha,
se foi para você que abri todas as cercas
e de você me cerquei inteira?
Não deseja mais a minha língua carinhando sua orelha,
nem minhas mãos descobrindo os teus espaços?
Por que despreza os anos luz de um amor infinito
e de uma paixão que preenche todos os vazios,
e esvazia aquilo que nunca nos teve sentido?
Me diz, me diz de verdade, responde esses porquês.
Depois, volta pra cama, traz um copo de vinho e apaga a luz.

sexta-feira, 20 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... IMPOTÊNCIA

Por Gabriela
A corda arrebenta um dia.
A gente se arrebenta um dia. De tanto fazer esforço pro contrário.
Um conselho?
Não se deixe chegar à sensação de impotência.
Quando ela vem, é porque a corda esticou demais.
Um sopro e rompe.
E aí é estrago que nem sempre se dá pra consertar.
E machuca, ah como machuca.
Por Mariângela
A minha humanidade me incomoda.
Pareço piegas, porque quando percebo,
não sei conter o choro desse oco,
um sem fundo que me toma.
Doi demais ver pessoas miseráveis,
crianças sem destino, amores vãos,
gente que mata tanta gente,
morte em forma de indigente,
medos atordoando pessoas sãs,
violência em alguns olhos verdes,
covardia em outras iris,
alegrias tingidas por sorrisos falsos,
dentes brancos que nunca sorriem,
multidões de indivíduos solitários,
bichos que parecem humanos,
humanos com jeito de bicho,
desumanos que desamam...
Em que lugar de meu destino
perdi a capa, a espada e o elmo encantado?
Para onde foram meus super poderes imbatíveis?
Quando esqueci todas aquelas mágicas?
Onde está, meu Deus, a tal fé que era meu escudo?
Hoje só me resta esta impotência maldita!
Por Sócrates
É duro admitir, mas aconteceu. Ao longo desses 40 anos, nunca vacilei, mas, desta vez não deu. E não é culpa dela. Na verdade, na verdade, ela é novinha, novinha, aguenta qualquer um. Pode ser velho, adolescente. Pau para toda obra. Só que na hora de engatar a primeira troquei os pés pelas mãos e arranhei a marcha. Estourou o motor da minha motocicleta por causa de um descuido besta. Anos de carteira de motorista jogados fora. Jamais esquecerei deste dia. Agora sou um homem impotente.

quinta-feira, 19 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... ALMOÇO

Por Gabriela
- Café?
- Não, hoje não. O almoço não desceu bem.
- Tava ruim?
- Não, a comida não. Alguma coisa em mim, ruim, que anda me negando os bons sabores.
- Assim como?
- Assim, como se tudo fosse mesmo, sem sal.
- Tudo?
- Tudo...
- Faz tempo?
- ...ah, faz um pouco sim. Acho que desde segunda, uma semana talvez, talvez mais...um quase muito tempo.
- Que será?
- Sede, acho. Uma sede que tenho. De tudo, não de água. De gentes.
- Sede de gentes?...Que tira o sabor de tudo?
- Tira...porque as gentes não vêm e nada me alivia a garganta...nem café, nem nada.

(...) Pausa para a digestão.
Por Cristina
Tinha vontade de conhecê-lo mas, medrosa como sempre, não demonstrou. Foram várias reuniões e a cada vez ela observava um trejeito, um jeito, alguma coisa...gostaria de poder olhar mais.
Um jeito de andar despachado, desligado, um jeito de vestir bonito, esporte, um jeito de falar sorrindo, fazendo rir, um sorriso levantando o cantinho da boca, um queixo bem feito, e quando colocava os óculos, um charme!
Um dia tirou o casaco do sempre terno no meio da reunião,calor, falou, ela se importava? Não, absolutamente, ficasse à vontade. O jeito de tirar o paletó e colocar no espaldar da cadeira, o jeito de levantar, o corpo ainda bonito apesar da madurice, parecia praticar algum esporte, ficou curiosa mas não perguntou, falou das cifras, perguntou valores.
Houve uma ocasião em que se pegou olhando as mãos dele, depois olhando a boca, lábios, ai a boca, os lábios, perdeu-se um pouco, escapou-lhe o assunto, será que ele percebeu? Lembrava-se também do dia em que se levantara para pedir um café e ao voltar viu como ele a olhava, ou será que era impressão? Sorriu, fingiu que não viu, o café já vem, vamos continuar?
Ali ele na sua frente, então ta, marcamos a próxima para a semana que vem? E então ele disse: e o fim de semana? Hã? Como? Isso, o fim de semana? Podemos nos ver? Tremeu. Nos ver? Que tal almoço?
Quase tropeçou, coração disparado, ele percebeu, segurou seu braço.
Então ela olhou bem nos olhos dele e sorriu. Almoço!
Por Mariângela
A praça de alimentação do shopping estava cheia.
De bandeja na mão, ela seguiu andando, à procura de um lugar vago.
Foi e voltou algumas vezes e nada. Tudo ocupado.
Num canto, um rapaz, com seus 30 anos, comia sozinho, numa mesa para quatro.
Meio tímida, mas com fome e pressa, vendo que sua comida esfriava, aproximou-se e pediu:
"Posso sentar aqui?"
Ele olhou meio surpreso, mas autorizou-a com um sinal de cabeça.
"Obrigada", ela sussurrou enquanto ajeitava-se na cadeira.
Os olhares se cruzaram entre algumas garfadas.
O mais intenso foi quando ela levou o copo de suco à boca, sorvendo os goles com vontade.
E ele garfava pedaços de abacaxi enquanto correspondia àquela sutil paquera.
Tudo não durou mais de 20 minutos, e ele prolongou sua estada porque acabara de consumir seu PF fazia algum tempo.
Ela levantou-se jogando os cabelos para trás, caprichou no sorriso e soltou um atropelado: "Tchau, obrigada".
Ele respondeu com um gesto com as mãos, meio sem tradução, e devolveu outro sorriso: "Imagine! De nada!"
E a vida continuou, cada um na direção de seus carros, em andares diferentes do estacionamento lotado.
Ela abriu a porta, sentou-se contrariada frente ao volante e soltou uma frase solitária:
"Essa vida fast food é uma merda!"

quarta-feira, 18 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... FERIDA

Por Gabriela
Há bem pouco tempo ando tirando os band-aids da alma.
Estavam lá, molhados e feios, já quase desgrudando, soltando aquela colinha chata.
Acostumados à anatomia, já sem serventia.
Não lembranças das feridas, nem cicatrizes.
Como se ali, nada nunca tivesse sangrado.
Há bem pouco, muito pouco tempo não me machuco.
E saber inúteis os curativos, é paz.
Por Mariângela
Hoje eu fui para o divã do analista.
Faço isso uma vez por semana.
É minha segunda vez em 47 anos.
A primeira durou 12 - os mais difíceis e melhores de minha vida.
Não tinha divã. Nesta fase, há 4 meses, tem.
Deitada ali, olhando para mim mesma, sinto-me ferida aberta.
Como se mergulhasse em um tonel de água oxigenada, sabe?
Que borbulha onde falta pele nova, para que tudo seja limpo.
Volto no tempo e me dou conta de como algumas coisas ainda doem, mais do que pensei.
Mas é só no divã que vivo a sensação de estar sangrando em meus cortes.
No dia a dia, parece que a morfina da rotina mantém tudo adormecido, quase imperceptível.
Só que às segundas-feiras, volto a meter o dedo em cada ferida.
Cutuco, sofro, repenso, choro, como a viúva que perdeu seu melhor parceiro,
e depois descobre que, no fim, ele era um grande sacana!
Saiu cansada, mas um pouco mais cicatrizada nos pequenos buracos negros que abri em minha alma.
Ainda sou colcha de retalhos. Há coisas que não se encaixam. Há dores que não cessam.
Só que hoje, ali deitada e entregue à minha vida, me sei por inteiro, cada parte que ainda desconheço
e cada espaço que preencho de sabedoria ou da teimosia de quem ainda não se perdoa.
Não sei, mas desconfio, que estes poucos meses serão os melhores e mais difíceis de minha vida...
Por Cristina
Abri a janela, amanhecia o dia, uma borboleta branca entrou. Voou pela casa, visitou os cômodos e, decidida, pousou no sofá.
Cheguei perto de mansinho, deixou que eu me sentasse ao lado, fiquei, ficou, ficamos paradas, cada uma com suas recordações.
Vez em quando balançava as asinhas e eu pensava não vá ainda e acho que escutava porque pacientemente ali ficava, alimentando meus pensamentos que voavam, a ir e vir.
Então mexeu-se novamente, levantou um pequeno vôo e, decidida, pousou delicadamente em mim; branca, leve, arrojada, linda, e de tão linda remexendo lembranças e de tão linda abrindo, de novo, a ferida.
Tenho saudade de ti. Ai que saudade dolorida tenho de ti!!!!

terça-feira, 17 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... FÍSICA

Por Mariângela
Sempre sofri para ir bem numa matéria da qual não sei nada. E olha que dizem que tudo é física. Desde quando acelero meu carro até no engate da ré de minha consciência nas horas de arrependimento.
De física só acho graça na língua que Einsten descabelado mostra na foto emoldurada e pendurada nas paredes de bares, casas, puteiros, restaurantes, salas de espera, postos de gasolina e capas de caderno.
Só isso tenho a dizer. O resto eu decorava, pra ir bem na prova. E quem tudo decora tudo esquece.
Eu esqueci a física e ela me esqueceu. Melhor assim.
Por Cristina
É uma questão física.
Um calor que se espalha pelo corpo, uma vontade de contemplar o horizonte.
Depois é como se uma nuvem tomasse conta dos momentos, a mente floreia cenas, perfuma quadros, apaga imperfeições.
O coração pula, a mão sua e treme, a boca sorri sem esforço, os olhos ficam semi-cerrados, lágrimas alegres correm, emoção toma conta.
E então não vejo mais nada.
Pulo do trampolim, mesmo sem saber se o vazio é suficientemente fundo, se há braços que amparem ou se vou me esborrachar.
Pior, é que mesmo quando me esborracho, nunca acho que seria melhor não te pulado!
Por Gabriela
Um dos meus professores de Física era ruivo.
Tive uma paixonite por ele, na época do colegial.
Ela não era bonito, mas era ruivo. Talvez isso tenha me atraído.
Ou aquela paixão dele e graça ao ensinar. Ele era bem humorado, ‘amigo’ dos alunos, sem perder a autoridade.
Um cara bacana, muito bacana.
Ninguém entendia minha atração, diziam que ele parecia um duende de conto de fadas.
Eu não ligava. Talvez porque também não entendesse o que nele, me atraía.
Foi único período em que a matéria fez algum sentido pra mim e tirei boas notas.
Depois dele, a Física voltou a ser quase sempre mistério, ainda que ternas lembranças tenha deixado.
Eu acho que a culpa foi mesmo daquele cabelo ruivo dele.
Por Sócrates
Os apóstolos estavam exaustos. Joga a rede para cá, joga a rede para lá. E o Cristo lá, deitado, na maior. Um pouco ressabiado com aquela situação desafortunada, o Pedro enfiou na cabeça de nosso Pai, Filho e Espírito Santo um balde dágua. Misericórdia, é o Mar Vermelho", gritou o Salvador. Que Mar Vermelho o quê, disse Pedro. Que brincadeira é essa rapaz, eu Sou o início, o meio e o fim. Deixa de conversa Jesus, até agora eu só vi a tal da água virar vinho e na verdade ainda não comi muito bem essa história. O pessoal já tava um pouco pra lá de Bagdá e acho que nem perceberam o que ocorreu de fato. E o que ocorreu Pedro, você dúvida da minha condição divina. Duvidar até que eu não duvido não, mas, se vossa santidade quiser que eu relate sobre aquele pó misterioso, posso falar agora mesmo. Vossa santidade é o papa, é bom você ficar no seu lugar seu pescador de m...olha...escute uma coisa...você vai me trair três vezes...Se eu te contar o que o Judas tá negociando você se daria por satisfeito. É o seguinte Eu sou o início, o meio e o fim, a gente tá sem peixe e, portanto, não vai ter Santa Ceia. E eu com isso. E eu com isso, ora mais essa. Meu Salvador, convenci esses onze homens que você era o cara, que a gente ia deixar de pagar os impostos de César e o escambal e o nosso Salvador não ajuda nem pescaria. Olha...aquela história de repartir o pão e o peixe para um milhão de pessoas é conversa. De tanto repetir aquela história até o Senhor já se convenceu. Olha Pedro, veja só, deixa de zoeira no meu ouvido viu. Olha, já fui. Vai para onde, não estou física não é, só fica atrás dos livros sagrados, dá nisso. E Cristo se arribou em cima do mar enjuriado. Mas rapaz, você tá andando, perdão, perdão, o Senhor tá andando em cima da água. Agora dá a rede para cá que vou pegar esses peixes para vocês seus hereges, homens de pouca fé. Onde já se viu rapaz, duvidar de Deus. E um mundaréu de peixes encheu a embarcação. Empolgado com a andança e o milagre, Pedro fez um pedido para Jesus. Deixa eu andar também na água. Venha, venha. No inconsciente, Jesus pensava, Venha miserável, venha. Depois de beber meio quilo de água, Jesus pegou Pedro pelos braços. Tá pensando que isso é para qualquer um é, agora vamos que temos que realizar a Santa Ceia, ser crucificado e depois ressucitar. E tudo isso em apenas dez páginas de um livro que tô pensando em chamar de Manifesto do Partido Comunista, mas também estou pensando em um nome mais curto, Bíblia.

segunda-feira, 16 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... TORMENTA

Por Gabriela
E o que mesmo sobrou depois de tudo?
Do estômago embrulhado depois do beijo arrancado à força quando já não era amor mas desespero de dois que não sabem como se largar mesmo depois do destroçado fim, início de começar a tomar lugar o mais puro e perigoso desprezo um pelo outro?
O que? Depois do devassar de toda intimidade, da exposição crua, do percorrer dos avessos até a exaustão? Depois de saber do outro até o que o próprio nega? E escarafunchar, cutucar, achar até o que não se sabia vivo? Sobra o que?
Amor nunca foi, que não é isso.
Tormenta. O fantasma de não se poder sozinho, de não se olhar por dentro e precisar sempre um outro – de muleta, de consolo, de espelho, de saco de pancada.
Claro que não, claro que não sobra nada depois disso.
Os cacos, reais, são de carne viva. Mas os sentimentos se preservam intactos, porque nunca houve nenhum.
Nenhum.
Não há restos se houve nada.
Por Mariângela
Sei que ainda viverei muitas tormentas,
porque sou barco sem vela, leve e frágil.
Mas só uma vez fiquei à deriva.
Foi quando descobri que ser nau sem rumo
é a solidão que me tornou náufraga,
afogada num imenso vazio, ancorada no meio do nada,
mesmo sabendo de um alguém que se dizia ao meu lado.
É a solidão perversa do não ser amada.
Por Sylvia
Ele gosta de se deixar levar. Qualquer corrente de ar, brisa ou aragem lá está ele, no ângulo certo que o suspende do chão e aí flana com gosto e sem culpa; mas gosta ainda mais de pé de vento ou rajada das que levantam pó, sente emoção forte, frio no estômago, arrepio na pele. Conhece todas as manifestações do ar em fúria: rajada, furacão, turbilhão, tornado, até redemoinho e minuano, aquele vento frio e seco que vem do sul e atravessa o país chegando até o norte. Surge gelado e penetra os ossos, trazendo o frio dos Andes. Gosta dos alíseos também, que de tão úmidos adoecem o pulmão e deixam as pessoas loucas.

sexta-feira, 13 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É...POESIA

Por Cristina
Quando olhos não brilham,
poesia?
Quando inspiração não vem,
poesia?
Quando peles não conversam,
poesia?
Quando lógicas não casam,
poesia?
Quando ilusão morre,
poesia?
Quando omissões e traições,
poesia?
Quando esperanças se acabam,
como fazer poesia?
Por Mariângela
Ele levanta e dá de cara com a avenida em ebulição.
Os carros passam, buzinam, se atropelam,
se confundem com animais na savana árida e cinza.
No vão de uma lage, ele guarda seus pertences:
a cama, um papelão duro que um dia embalou uma TV de plasma, 42 polegadas,
o cobertor todo empelotado de poeira, folhas e o que mais foi possível arrastar consigo,
a sacola rasgada CVC, com duas camisetas sem marca, uma cueca furada, um pente e um copo
e o bloco de papel e a caneta bic quase sem carga.
Consegue lavar o rosto na água que brota da parede de um viaduto por perto.
Olha de novo para o seu cenário: outros como ele, dividindo o infinito do nada.
Faz a caminhada costumeira percorrendo suas ilhas, que separam as avenidas.
Pede um trocado aqui ou ali, conforme fecha o semáforo.
Junta 3 reais que gasta com um pão e manteiga e ganha de um qualquer o pingado.
O dia passa e ele segue sem rumo, pensando porque, afinal, ele foi parar ali.
Insiste, persiste, mas não se lembra como tudo aconteceu.
Só sabe - e isso é certo - que seja lá como for, ele não pode enlouquecer
e faz um exercício diário de encontrar poesia naquilo que a vida lhe presenteia,
registrando no bloco sujo, com a caneta velha:
"comprei o pão e o homem, bom coração, me deu um pingado.
Meu olho ficou molhado, porque ainda sinto emoção.
Não tenho medo do vazio que hoje habito
só temo esquecer que ainda existo
e perder a noção, o meu colchão papelão e o que resta da minha rima
que combina lembrança com esperança,
sofrimento com cabimento, desespero com ser faceiro.
Só não sei o que será quando a tinta acabar.
Talvez, enfim, eu morra, o que combina, então, com porra!"
Por Sócrates
.....................................................
.....................................................
.....................................................
.....................................................
.....................................................
.....................................................
.....................................................
.....................................................
.....................................................
.....................................................
.....................esperando a poesia.

quinta-feira, 12 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... ABDOMINAL

Por Mariângela
Você me aparece
Você sempre some
Às vezes sorri
e olha de rente
eu vejo e te encaro
ou sigo em desprezo
Respiro e prossigo
seu rosto em meu beijo.
É essa a lembrança
que guardo na sala
seu quadro emoldura
meu tempo ocioso
é quando retraio
e elevo meu ventre
deitada no chão
te vendo de frente.
Por Gabriela
Começou com um pequeno desconforto. Uma dorzinha de nada.
Depois evolui para uma pontada, pontadazinha; é verdade; mais pro lado esquerdo.
Imaginou algo gástrico, já que era na região abdominal o incômodo.
Má digestão, talvez. Fígado, será?
Úlcera não, que não era no estômago, ainda que um pouco de azia sentisse às vezes.
Enjôo nenhum, mas uma tontura um dia, que a deixou branca feito cera.
Coisa estranha! Que não era de ter nada, difícil ficar doente, correr pra médico.
Talvez nervoso, cansaço. Fundo emocional – um medinho sabe-se lá do quê, porque ‘cabeça é tudo’, né?
Ia deixar passar mais uns dias, não havia de ser nada – se piorasse, iria ao médico.
Mais uns dias assim, meio chatinha, mas levando.
Então quando teve que correr pro banheiro, tonta de náusea e enjôo, quando sentiu o cheiro do perfume delicioso do marido, ficou preocupada.
Xiiii! Será? ‘Barriga, barriga mesmo?’
Correu pra farmácia, descabelada e branca, zonza e esperançosa. Será?
Ah, seria tão bom se fosse sim, barriga...

quarta-feira, 11 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... FEIJÃO

Por Gabriela
Tava desenxabida. Sabe desenxabida? Essa coisa nem cá nem lá? Um morno chato, uma vontade manca, um humor omisso. Mais pra reclamar da vida, pra implicar com a colega chata que faz cara de Poliana a existência inteira e tem voz de quem está rindo indeterminadamente mesmo quando o assunto é dos mais sérios e pentelhos (sim, concomitantemente). E dona daquela impaciência crônica que faz acreditar que o mundo se transformou num grande complô pra te aporrinhar, estragar o dia, lembrar que você nem deveria ter levantado da cama, quiçá sair de casa! Então, desenxabida e irritada, querendo morder o primeiro infeliz que ousasse cruzar seu caminho com aqueles risinhos bobos na cara. E eis que a amiga chama pro almoço. E além dela, mais duas amigas. E a caminho do restaurante, aquela falação meio raivosa contra as chatices do dia a dia, as pessoas e suas incongruências, as falsidades, politicagens...até diluir, virar risada, sair como desabafo e ficar infinitamente minúsculo, quase pó. E somada a isso, na fila do self-service, aquele feijão preto delicioso, luzidio, cheirando carne gorda e tempero de cozinheira de mão cheia! Fez esquecer tudo, aquele prato de feijão no almoço, cercado de amigas com quem se pode compartilhar coisas da vida, quaisquer. E na volta ao escritório, depois do café, só conseguia pensar que tinha sido bom ter saído da cama de manhã cedo.
Por Mariângela
Separando os grãos, ele viu um muito diferente.
Pensou, a princípio, que estava estragado.
Mas analisando de perto, apalpando e sentindo o cheiro,
se deu conta de que era um feijão raro, que brilhava contra a luz.
Não colocou com os outros, nem cozinhou-o em separado.
Achou tão especial e único, que guardou-o dentro de um vidro,
numa prateleira qualquer do armário da cozinha.
Anos se passaram, até décadas, e o feijão raro ali, no vidro.
Quase todo o dia o homem admirava e contemplava o seu achado.
Ria-se ao pensar que ele era dono de um feijão inigualável. Ele, só ele.
Mas então o homem morreu, foi velado e enterrado.
No testamento, os bens repartidos entre seus entes não citavam o feijão.
A casa foi vendida e a nova família encontrou o vidro solitário, na prateleira.
Olharam, analisaram, cheiraram, apalparam
e não viram qualquer sentido naquele feijão.
Acabou triturado na caçamba do caminhão de lixo.


Por Cristina
Destampou a panela e colocou o rosto sobre o vapor. Se ficasse ali algum tempo será que as gotas de suor cairiam sobre a comida, la dentro? E as pessoas, perceberiam o gosto da sua pele entre os temperos? Que nojo!!! Afastou-se mais do que depressa.
Que maneira mais estranha de encher a cabeça para passar o tempo!
O ato de cozinhar tornara-se mecanico demais e subterfúgios como este eram necessários para que não enlouquecesse por completo.E se espirrasse um pouco de perfume dentro da comida, bem pouco, será que faria mal para as pessoas?
Sim, devia confessar que um pouco desnorteada, já estava. Como não estar, fazendo aquela mesma coisa todos os dias? Fazia, eles comiam, ela lavava; fazia de novo, eles comiam, ela lavava; no dia seguinte começava tudo de novo.
Não é que não gostasse de cozinhar,mas há muito não sentia prazer algum. Precisava de novidades. Fazer uma nova receita? De que adiantaria? Juca só comia arroz se acompanhado de feijão; Cibele não gostava de salada; Carlota só comia carbohidrato; ninguém gostava de peixe; macarrão só com molho de tomate; bife só muito bem passado; batata sempre....Tudo muito cansativo. Fora os temperos: sem salsinha para um, com muito louro para outro, nada de orégano, só uma pitada de pimenta, bem pouco...
O ato de cozinhar tornara-se tão morno, tão desprovido de elogios....
Foi então que teve a idéia. Modificaria as coisas. Queria ver se não reparariam. A cada dia não faria para um deles bem aquilo que repetidamente comia, dia após dia. Ficou contente! Começaria hoje. Isso. Feliz começou a descascar batatas!
Hoje Juca, se quisesse arroz, teria de comê-lo sem o seu feijão.
Por Sócrates
- "O arroz deu cacho e o feijão floreiou. Milho na palha, coração cheio de amor".
Uma multidão avança sobre a câmara e canta:
- "O arroz deu cacho e o feijão floreiou. Milho na palha, coração cheio de amor".
Por de trás da câmara uma lágrima e a frase de Che: "Quando o extradiornário fizer parte do cotidiano, terá a revolução".
No acampamento longe da fala fácil de Mirian Leitão, Renato Machado, Alexandre Garcia e todos os filhotes do neoliberalismo - as pessoas cantavam e plantavam feijão no lugar de eucalipto. Afinal, todos queriam comer. E eucalipto não se come.
Seria mais um dia após a ocupação, o que o acampados chamam de resistência. Uma etapa superada por trabalho e suor; porque, só se resiste produzindo, porque, só aguenta a resistência, quem canta:
- "O arroz deu cacho e o feijão floreiou. Milho na palha, coração cheio de amor".
Atrás da câmara a lágrima ganha um adepto: o arrepio dos braços e uma nova canção:
- "Quebra, quebra, quebra, quebra cadeado, o MST é o povo organizado".
Afinal, quebrar o cadeado é uma atitude cultural, teria pensado o diretor.

terça-feira, 10 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... FUMAÇA

Por Mariângela
Não era rio, nem neve em abundância.
Não teve frio nem calor escaldante.
Muito menos a brisa do outono
ou o sol manero da primavera.
Não eram terremotos nem vulcões em erupção
ou maré alta, ressaca brava, seca e estiagem.
Era apenas aquela quase nuvem leve e clara.
Assim você me foi, assim você se foi,
fumaça...
Por Gabriela
Uma última tragada de você. Preciso.
Te solto depois, prometo.
Em um expirar lento, te expulsando fumaça de minha boca e cada um de meus poros impregnados.
De uma hora pra outra sim, que assim se livra de um vício. Pela raiz.
Porque delícia e mal se misturam neste desvario repetitivo de nunca parar.
Paro hoje, te empenho minha palavra.
Depois de um último desesperado tragar.
Pra lembrar o gosto, da cócega que me fazia sorver-te.
Por Cristina
Tire-me desta fumaça por favor, estou sufocando.
Você não está vendo? Vem de todos os lados, não sei como consegue respirar.
Já não sei mais o que fazer. Ando como se estivesse nadando, dando braçadas para abrir caminho até você.
Tudo negro, só você não vê.
E a fumaça que sai de nossas bocas quando falamos? E o rastro que nossas mãos deixam quando se movimentam? E a falta de ar que nos faz tossir? E os olhos? Porque sai esta poeira dos teus?O ar puro se foi.
O sol já não nos alcança.
Tudo se atrapalhou.
Fumaça é tudo o que temos para trocar.
Por Sócrates
Uma fumaça lilás. Restam poucas lágrimas, apenas um suor colorido pela tintura opressiva do capitalismo. A doçura das manhãs derrete-se entre os vestidos e os seios impávidos das mulheres. O noticiário local informa o fim da greve e esquece os motivos da paralização."Um salário justo" teriam dito se pudessem. Sem espaço, sobrou a fumaça lilás e uma última homenagem. Uma mensagem que encobriu o céu clandestinamente, sem a permissão dos algozes patrões. Todas morreram. Não tem mais café fresquinho, tão pouco o beijo macio acompanhado por uma canção de ninar. Felizmente, um último suspiro. Lilás.

segunda-feira, 9 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... COLAR

Por Sócrates
Avistei o universo inteiro dentro dele
Apanhei cada pérola
Costurei cada uma
Amarrei cada pedra
Avistei o inferno inteiro dentro dele
Cutuquei a sua nuca
Acariciei a sua boca
Rasguei a sua roupa
Estou no mar
Estou no infinito
Apenas o corpo e o colar
Como se fossem um olhar
Como se bastasse amar
Primeiro, o colar
Depois o corpo
E enfim, o mar
Por Mariângela
É no meu pescoço que penduro tuas lembranças.
Balançam cada vez que caminho nesta estrada
Um colar que se liga por idéias e sonhos,
unidos por um fio sem nós ou fechos.
Não o tiro, porque tua presença ainda orna minha vida.
Talvez, um dia, me canse das mesmas contas,
queira outro fio para juntar meus cantos e unir meus pontos.
Por ora e encanto, ainda te levo comigo,
por enquanto, basto-me assim.
Por Cristina
Quero pele macia contra meu corpo,
arroubos de noites de não dormir,
quero volúpia, entrega, desvario,
gemer, querer, sorrir.
Quero perder-me do mundo
num roçar de lábios,
como as contas macias
do colar em meu pescoço.
Quero, como o das pérolas,
o brilho de velas,
a luz difusa,
a sussurrar desejos.
Quero lampejos!
Quero o enlaçar de braços
desejos unidos,
corpos despidos,
arfares,
rufares e beijos.
Quero fusão,
quero perder-me
sem aviso de antemão,
sem ilusão.
Quero paixão
Por Gabriela
Um colar de contas me conta toda.
O citrino amarelo minha avó me deu, ainda menina, pra carregar pela vida, feito farol. Pra dias escuros, pra sempre.
As pérolas vêm da outra avó, depois de minha mãe. Dos bailes de debutantes até hoje, pra acreditar em sonhos.
O coral vermelho pra aquecer o peito, de alguém que me viu crescer. E me viu sorrir muito mais que hoje.
A safira, pela formatura na faculdade, azul azul como prometiam o futuro naquele tempo. De meus pais.
Nem rubi ou esmeralda nestas voltas, que muita coisa minha vida ainda não tratou de trazer.
O brilhante eu talvez quisesse em um dedo, solitário, pra me mostrar justamente o oposto de ser só.
Mas nem só de contas e pedras, a vida.
Um brilho de olho, só, também dá conta de me contar toda.

sexta-feira, 6 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... ÍNDIA

Por Gabriela
Noz moscada. Curry. Páprica. Incenso.
Taj Mahal. Kajal. Sári. Pele cor de azeitona.
A Índia me chama pelos seus sabores, suas cores, histórias de mil e uma noites.
Repele-me pelo sujo, pela divisão em castas, pelo predomínio da tradição em detrimento da emoção e do novo.
Eu não colocaria minha mão no imundo Ganges – por místico que preguem.
Não reverenciaria vacas nem ratos, elefantes talvez (mas não montaria em seus lombos).
Iria sim, ao Taj Mahal, talvez apenas por uma ilusão romântica à toa.
Me chamem de preconceituosa, mas eu não tenho a menor vontade de ir à Índia.
Talvez eu esteja longe da iluminação. Talvez me falte amadurecimento e espiritualidade.
O fato é que não quero.
Não vou pra lá.
Por Mariângela
Viajei para a Índia, ontem à noite, deitada no tapete da sala.
Meu véu balançava ao vento, enquanto caminhava nas ruas
entupidas de carros, pessoas, camelos e vacas sagradas.
Não sei porque escolhi a Índia para essa viagem imaginária -
fuga inconsciente de meus dias em uma cidade como esta onde vivo?
Talvez a simplicidade, a beleza das moças morenas,
com gotas coladas no meio da testa, ornando um terceiro olho que eu não tenho.
Ou a música sensual e a plástica das danças que me envolve em um gostoso remexer.
Fito um horizonte de construções lindas, que convivem com o tempo secular.
É muito encantamento... eu sinto... muita magia... eu vivo... muito sonhar.
E eu tão zen, tão bem, vou além... bem pra lá de Marrakesh.

quinta-feira, 5 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... UIVO

Por Cristina
Uivava por qualquer coisa. Ficava bravo uivava, ficava triste uivava, raivoso, desanimado, uivava por tudo.
Ela achava engraçado. Não conseguia condoer-se de alguém que uiva. Estava acostumada com tristeza, com choro, com pessoas que tinham dó de si mesmas, mas não com uivos.
Conversou com ele, explicou, queria que ele entendesse que para ela, a linguagem dos uivos era incompreensível. Mas de nada adiantou. Os uivos continuaram. Alguns eram seguidos de acessos de silencio profundo em que nenhuma aproximação era considerada digna de atenção e, conseguisse uma conversa, era seguida de novos uivos.
Quando enfim voltava a calmaria ele parava de uivar e este sim era o ele que ela gostava. Porém, a qualquer momento, por quase nada, os uivos voltavam.
Ao primeiro uivo da ultima série, saiu de perto. Foi indo, foi indo e se foi. Até hoje quando se lembra acha engraçado e ri. Mas chegar perto de novo, nem pensar!
Uivo não!
Por Sócrates

Porra, véi... dia bonito da porra que fez domingo. Levantei cedo pra caralho. Quando abri o olho, tava batendo 11:30 no relógio. Dei uma espiada na broca da parede e vi o solzão virado no estopô. Balancei a nêga do meu lado e disse carinhosamente: "Acorda, porra. Acorda nessa desgraça que a gente vai quebrar essa gelada na praia antes de ir pra Pituaço".Como era um dia muito especial pra mim, resolvi levar a sacaneta pruma praia de bacana. Jardim de Alá. Ou como diz meu bróder Obama:"God´s Garden".Peguei meu ingresso, o dinheiro do buzú e me piquei com a neguinha.
Normalmente eu escolho a barraca que eu vou ficar pela trilha musical. A que tiver tocando o som mais nigrinhagem, é a que eu fico. Fui passeando entre as barracas e comecei a ouvir um som que eu não escutava há uns 10 anos. Um repertório que ia do antigo Gera-Samba, passando por Neon do Samba, Pagolada, Feras Potentes e finalizando com o show do Kiribamba LIVE em Juiz de Fora (MG). Só os clássicos.
"A capenguinha, a capenguinha, a capenguinha, a capenguinha, a capenguinha, a capenguinha quer andar. A capenguinha quando não tá de muleta, ela pega no porrete pra poder se equilibrar..."
Era esse o nível do som. Puro jazz. Bom pra caralho.O nome da barraca era Ponto G. Pronto. Achei a porra do Ponto G. Pelo menos uma vez na minha vida eu achei essa porra. Com um nome desse, não tive dúvida. É aqui mermo.
Pedi logo uma gelosa e uma dúzia de lambreta. O lugar era muito bacana. Várias gostosas. O único mal é que tinha muito pombo. Parecia o Barradão, a porra.Tava tudo muito de fuder até a hora que encontrei Marquinho Sabonete.
Sabonete é um torcedor do vice. Ele tem esse apelido porque, dizem as más línguas, quando ele serviu ao exército, foi tomar banho, deixaram cair um sabonete e ele foi catar do chão. Depois desse incidente, o bicho ficou manco. Não sei porquê.
O fato é que o sacana resolveu tirar sarro com a minha cara. Disse que eu não tinha estádio. Que tava a não sei quanto tempo sem ganhar porra nenhuma e todas aquelas merdas que a gente tá acostumado a ouvir dos vices. E pra fuder com tudo, ainda disse que a gente ia tomar pau do Ipitanga!! Aí eu pirei. Mandei ele repetir o que ele disse:
- Repita aí o que você falou, véi..- O Jahia vai tomar de 1 a zero do Ipitanga - o filadaputa repetiu.- Repita aí de novo, véi...- Tá surdo, porra gordo?? o Jahia vai tomar gude preso do Ipitanga.
Rapaz... o sangue me subiu à cabeça. E a nega dizendo "calma, calma". O garçom dizendo "segura o gordo". E a baiana de acarajé dizendo "fudeu!!". E o pombo dizendo "gurururu, gurururu...." aí eu explodi.
- Ó seu viado desgraçado filadaputa corno manco do cu brocado. O Bahia hoje vai meter de 4 que nem fizeram com você no quartel, sinhá nisgraça. Só vou apostado, miserável!!
- Bora!! Pra cada gol do Bahia, uma grade pra você. Pra cada gol do Ipitanga, uma grade pra mim.
Eu não sei se o sacana tava bebo ou maluco. Só sei que aceitei a porra da aposta doida do fornecedor de briôco.
Saí virado na porra da praia. Já era dez pras três e eu ainda tinha que pegar a zorra do buzú pra Pituaço. As palavras de Sabonete ecoavam na minha cabeça... mas o Bahêa não ia me decepcionar. Não dessa vez.
Cheguei lá no estádio e me arrepiei de ver a massa tricolor. Puta que pariu. Coisa linda demais. A cidade é nossa, galera. Agora temos 2 estádios!! Um numa ponta (a boa e velha Fonte) e o outro na outra ponta da cidade. E que estádio. PituAÇO é lindo pra caralho. Me senti numa Copa do Mundo. Sem putaria nenhuma.
Hino do Brasil, Placar eletrônico de última geração, helicóptero jogando pétalas brancas, vermelhas e azuis... um SHOW!
Fui pegar logo meu copão de cerveja. Cerveja cara da porra!! 3 real lá dentro. E o balcão também era meio apertado, mas vamo nessa. Começou o jogo. O Ipitanga na pressão e eu ouvindo a voz de Sabonete na minha cabeça... "O Jahia vai tomar cacete" porra... será que vou ter que pagar engradado praquele viadinho??
Minha cerveja acabou. Mandei a nêga pegar outra pra mim. Foi ela subir a zorra da escada que eu só vi Élton matar a bola na coxa e meter um tirambaço pro fundo da rede!! Uivei feito doído. GOOOOOOL DO BAHIA MINHA PORRAAAA!!!! AHAHAHAHA!!! UMA GRADE!!!! UMA GRADE!!!! UMA GRADE!!!!Fiquei feliz pra caralho!!! Pena que a nêga não viu o gol... pena uma porra!!! Vai ver foi isso!!! Ela tava dando azar, a miserável.Ela voltou com um copão e fiquei vendo o jogo. O Bahia até que melhorou. Vai ver é viagem da minha cabeça. Deixa a nêga quieta curtindo o jogo do tricolaço.
Só que aí o Ipitanga desceu num contra-ataque virado na porra. O sacana do atacante chutou a queima roupa e Marcelo espalmou. O cara chutou de novo e Marcelo defende novamente. Caralho! Que sufoco.E pra fuder com tudo, meu copo ficou vazio.- Neguinha.... pega outra pra mim?Quando eu peço assim cheio de carinho, num tem não certo... a nêga faz tudo que eu quero. Lá foi ela pegar outra cerva.
Fiquei olhando ela subir pra pegar a cerveja. E não é que quando ela sumiu da multidão, Hélton Luiz recebe um passe da porra, sai picado, deixa dois zagueiros pra trás e BROCA!!! Uivei feito doído. GOOOOOOOOOOLLLL DO BAHIA, PORRA!!!! DUAS GRADES!!! DUAS!!! DUAS GRADES!!!!É grade pra caralho!!! Eu nem queria mais a cerveja que a nêga foi pegar. Fica lá, mizéra!!! Já tenho 2 grades!!! AHAHAHAHAHAHAH!!!Mas aí ela voltou cheia de chamego. Me deu um beijo na boca, entregou meu copão e a gente ficou curtindo o intervalo juntinho. Feliz da vida.
Aproveitei também o intervalo pra bater o mijão. Porra véi... banheiro de primeiro mundo. Mijar em mureta nunca mais. A porra limpinha, véi. Bonito pra caralho. Naquele dia eu tava achando tudo lindo! Até mictório.
Nada de mijar na mureta, viu, porra??
Começa o segundo tempo. O Bahia só administrando. Naquele reme-reme. Naquele toquinho pra cá, toquinho pra lá. Deu uns 20 minutos e a nêga percebeu que meu copão tava vazio.- Quer tomar, mais uma, preto?- Porra, nêga... pegue lá pra mim, vá...
E lá foi ela. Com aquele bundão pra lá e pra cá. Eu fiquei lá olhando aquele bundão lindo subindo a escada. Hipnotizado. Aí ela sumiu. Quando voltei o olho pro campo, tava rolando um bafafá na área do Ipitanga, a bola sobra pra Hélton Luiz e.... saco!!! Uivei feito doído. 3 grades de cerveja. Na moral... comecei a ficar com pena de Sabonete. Ô, meu Deus. O desgraçado vai ter que falar com a moça nos balcões BPN da Insinuante e pedir um empréstimo pra pagar minha aposta. Fale com a moça, filadaputa!!
A nêga tava demorando dessa vez. Mal terminei de comemorar o terceiro, quando o pequeno Ananias broca mais um. Quatro. Quatro a zero, papá!!! Quatro grades de pura alegria!! Uivei feito doído.Eu tinha cantado a pedra. Sabonete tomou no cu. Dessa vez não foi literalmente. Mas deve ter doído pra caralho do mesmo jeito.
Neguinha chegou com a minha cerveja na hora de um pênalty do Ipitanga. Só que o dia era do Bahia. Pituaçu era do Bahia. O sacana mandou a bola lá na casa da porra.
A torcida era só alegria. "Rubro-negro otário!! Enfie no cu seu aterro sanitário!!!". Era só o que se ouvia na saída do estádio. "Vamos torcer pro Bahia ser campeão, em Pituaçu meu Caldeirãoooo!!!". Caldeirão mermo. Aquela porra ferveu, véi. E se você não foi, vá!!! Porque é bom demais. E arranje um otário rubro-negro pra apostar umas grades. Eu já ganhei quatro, pai véi!!!
BORA BAHÊA, MINHA PORRAAAAAAAA!!!!

Obs: Não pude conter o meu uivo de alegria pela fase que vive o meu time do coração. Na Bahia todo mundo é Bahia. Quem não é Bahia torce para o Vice, o Vicetória ou simplesmente Esporte Clube Vitória.
Por Mariângela
Nunca acreditei nisso. Maldito ceticismo sem graça que só me atrapalha!
Mas nada como a vida, sábia encarregada das porradas cotidianas,
pra gente se rever e dar mão à palmatória, parar de cuspir pra cima
ou sentar no formigueiro achando que nada vai abundar.
Não me apresse que já conto o que me deixou desse jeito. Preciso, primeiro, respirar fundo.
Eu rezava aquele terço imenso, toda noite, ao pé do rádio, acompanhando o padre de sei lá onde, num AM 'estéril'.
Muito eu nem escutava...era um bzzzz....zzz...luchhhh....fiuuu.... de tanto chiado.
Mas eu seguia... ave-maria, pai-nosso... creio em Deus Pai...
Tudo ia bem até a primeira carreirinha de contas rosas.
Depois, meu amigo, era um decoreba, um trem sem sentido
que brotava de minha boca mole e da mente ausente:
ave-nosso... pai-maria... creio Pai... em Deus credo...
Até que um dia, no meio dessa ladainha noturna, ouvi um uivo forte e agudo, perto da entrada.
Fiz com a mão um "em nome do Pai" e encarei de frente, abrindo a porta.
Quase cai de costas sobre a cruz de madeira que fica a espreitar da varanda de casa.
Vi a besta, vi o dito - eu que só acreditava em anjo e santo, com aquela luminária na cabeça.
Quase mijei nas calças, mas fiquei firme, de terço em punho.
O bicho agonizava deitado aos meus pés. Uivava como se uma faca cravasse seu peito peludo.
E não é que era mesmo um punhal de prata?
Mas olhei nos olhos da coisa, as lágrimas do danado escorriam.
Acredita que fiquei com pena do tal? Que me ajoelhei e rezei para que aquilo lá não doesse mais?
E quando fiz isso - que doida que sou, não é mesmo? - a pata do monstro encostou na minha mão.
Juro que ouvi um ronronar baixinho: "tira isso daí pra mim, tira?"
Eu não sei de onde arranjei coragem - acho que do terço que larguei nas ancas da fera,
porque apoei meu pé no dito e com força puxei a afiada do meio do peito sangrando.
Não... não... pode se tranquilizar. Sente-se e termine o seu chá.
Ele não vai te fazer nada, não. Hoje sai cedo e volta bem tarde, porque é lua cheia.
Tem as tarefas de lobisomem para realizar - vai com Deus, menino!
Mas é isso, amigo, depois da tal noite, salvei o lobo da morte e hoje ele mora comigo.
De dia, ajuda nos trabalhos de casa, faz massagem nos meus pés quando tô tensa.
A noite, se a lua for outra, jantamos juntos, rezamos o terço e, dependendo de minha disposição,
rolamos no chão fazendo sexo selvagem
, porque não sou santa, né? Mas, creio.

Por Gabriela
Tem gente que pede em silêncio. E consegue.
Outros aos berros, à força. Conseguem também.
Alguns com delicadeza, quase miando. Claro que levam.
Outros nem pedem, alienados, e até estes, às vezes, conseguem.
Eu uivo.
Ninguém entende. Nem a lua.
Pessoa doida, ora.

quarta-feira, 4 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É... DROGA

Por Gabriela
Um comprimido minúsculo embaixo da língua e o cabelo dela ficou azul.
Depois começaram a surgir aquelas borboletinhas incômodas e absolutamente vermelhas.
Mais um segundo e se juntaram à festa, o bando de seriemas com vestidos balonês cor-de-rosa.
Mas elas não dançavam, andavam de um lado pro outro do salão, muito sérias.
Os javalis, que não economizaram na chegada barulhenta, dançavam em ritmo frenético.
Dava a impressão que seus Black-ties fossem rasgar a qualquer instante.
A sereia que chegou sozinha ficou um tanto deslocada. Faltava mar, acho.
Mas o fauno saltitava feito estivesse em estado de graça, sujeito mais alegre!
Um gole de água, esta droga disfarçada servida por um garçom equivocado, e todos eles foram sumindo.
Como se a festa tivesse acabado e todos tivessem sido convidados a se retirar.
Ah não, ah não! Outra daquelas, quando?
Correu até o banheiro escuro e pediu mais um comprimidinho daquele pro moço verde que tinha se instalado ali.
E a festa recomeçou, sem hora pra acabar.
Por Sócrates
Nasci no interior, e lá sempre ouvi falar na cidade. Desde pequeno me dediquei aos estudos para que quando chegasse à hora, pudesse passar num vestibular e estudar na capital. E aqui estou, prestes a me formar em Química. Por aqui já fiz alguns amigos, tarefa que não é muito fácil. Esses aí sentados são os meus novos conhecidos, quero conhecer gente nova e interessante, porque desde que cheguei aqui tenho andado sempre no mesmo grupo. Sérgio é mais fechado, fala pouco, mas no fundo parece ser um cara legal. Com André é bem mais simples, talvez por ter uma origem humilde, sempre me tratou bem e demonstrou interesse pela minha história. E essa garota ai é a Alice, não gosto muito de falar essas coisas, mas não posso negar que quando olho pra ela sinto uma pulsação diferente.
Neste condomínio as pessoas se “enturmam” em rodas, diferente do interior onde todos se conhecem nas portas das casas ou na praça.Alguns dias atrás, todos estranharam quando eu disse que não fumava maconha. Por aqui parece ser comum o uso de drogas. Me senti meio deslocado por não fumar, quase não participei do papo e muito menos das risadas.
Por Mariângela
Estava aqui pensando com meus botões azuis:
qual a droga deste século?
E viajo - mesmo plenamente lúcida - por imagens, visões, cenários...
Tudo para buscar respostas no meio da odisséia do dia a dia.
Ainda não conclui nada, porque essas divagações são sempre interrompidas,
não há tempo para ócio ou meditações relaxadas e entregues.
Retorno tempos depois ao mesmo ponto, como um bêbado que anda, anda sem sair do lugar.
Mas a resposta não vem, nem perto da ponta da língua, nem quando me vejo fumando passivamente junto aos amigos num papo sem fim.
Que droga será essa que acomete a humanidade na raiz?
Talvez ainda não a nominaram, nem sabem bem de que é feita.
Mas sei que, vez ou outra, me sinto contaminada,
vivo overdoses e ressuscito sem mesmo saber quanto tempo estive fora do ar.
Não sei o que é, para que serve, muito menos como livrar-me dela...
mas sinto que existe e todos os dias caminha pelas minhas veias.
Por Cristina
Olhou para o céu e viu frases escritas em rosa choque e azul turquesa pensou que lindo, que lindo e quando abaixou os olhos novamente viu um pavão que abria a cauda, barulhento, bem em frente a ela, levou um susto enorme! Medo foi o que sentiu mas no mesmo instante começou a escutar uma musica alto e falou vamos, vamos, me leva aonde está a musica. Ele, fingindo que acreditava foi com ela e quando ela tropeçava em buracos que não existiam, a segurava forte pela cintura. Chegaram a uma praça não havia musica mas ela disse tem sim, estou escutando! Vamos dançar. Ele ria, ria, como ele ria! Dançou, fazer o que? Se ela escutava ele podia fingir que escutava também mas não disse nada. Ela escutava e cantou com a musica, ele dançou, deliciado. Delicia dançar na praça com ela. Dançaram, dançaram, ela cantou, cantou, ele cansou, ela não, e então ele disse: vem, vou te levar pra casa.
Entraram na banheira e a água fazia cócegas, ela não conseguia parar de rir e ele só olhava achando graça, colocou musica, ela adorou, mergulhava na banheira e ria porque sentia cócegas, ele disse vem, secou o corpo dela, secou os cabelos, ela fechou os olhos e devaneava, fez poesias, recitou para ele, ele ria, deliciado. Sentaram-se no terraço e as luzes da cidade brilhavam ele disse olha as luzes, ela viu em cada luz um monstro e correu para o colo dele ele disse calma, é só luz! Ela ficou com vontade de chorar e pediu não sai de perto de mim, ele cantou e ela se acalmou e ele nunca mais esqueceu aquela frase, não sai de perto de mim, não sai.
Levou-a para a cama, cantou para que ela dormisse e ficou com ela. Não saio. Não saio nunca mais de perto de você.

terça-feira, 3 de março de 2009

Por Gabriela
Extremo sul. Fronteira do fim do mundo de um país com o começo do mundo de outro.
Sempre achei curiosa essa história de divisa. Quem determinou?
E de que vale uma linha imaginária que separa mundos?
Proibição maluca de eu colocar meus pés do lado de lá e estar em outro país, num segundinho só.
Se meu corpo não tem fronteira, este meu e este seu mundo também não deveriam.
Eu queria poder só me esticar toda e entrar aí.
E sentir na pele esta imensa viagem, ainda que nada tenha mudado – nem o solo, nem a cor do céu, nem o peso do ar.
Mas só de saber outro país, o que você habita, já tem um gosto de bom, de novidade, de exterior. De transponível*.
(*aqui não meu país, a consulta ao dicionário resulta em ‘verbete não encontrado’. Mas na consulta a intransponível, a definição é de ‘não transponível’ – isso acontece no seu país??).
Bem, mas eu me perdi e agora já não consigo mesmo chegar até aí. E só precisaria um passo. Estou aqui, no extremo sul.
A linha imaginária, os mapas me impedem. Eu seria considerada uma invasora – e só queria mesmo poder te beijar.
Quem inventou esse absurdo de divisa? Quem??
Sinta-se beijado além das linhas que nos separam e condenam.
Por Sócrates
A saia da moça revelava o interior dela. Logo abaixo do umbigo. Os rapazes deitavam no chão, remexiam as cadeiras, se contorciam para enxergar até a alma da garota. Alguns diziam:
- Vou para o inferno por ela.
- Até o Alasca.
- Ai meu Deus!
Na esquina, logo após o bondinho passar, uma brisa, daquelas do sul, soprou como se advinhasse os desejos viris da moçada. Alguém arriscou:
- Esse vento é macho.
- Bonitinha mais ordinária.
- Nossa Senhora!
Sem graça, a donzela virou a esquina e foi pega de surpresa pelo namorado. Por acaso você está na Bahia para andar deste jeito na rua.
- Você tá me chamando de quê?
Sem graça, o gaúcho tentou explicar mais só piorou a situação.
- É que na Bahia as mulheres são mais calorentas.
- Sulista filho da puta.
- Splac!
Por Mariângela
Na rosa dos ventos que revoltam seus cabelos
descobri os pontos cardeais, generais de minha vida.
Ao norte, o brilho forte que me acorda de pesadelos mundanos.
Ao leste, o riso agreste a secar as lágrimas sobre leites derramados.
Ao oeste, o peito largo onde encolho os meus sonhos para caber no seu pulsar.
Ao sul....ah, ao sul... é para onde vôo, me encaixo, modelo minhas formas
e espero, sem pressa, todo o inverno passar.

segunda-feira, 2 de março de 2009

A PALAVRA DE HOJE É...ESTURRICADO

Por Cristina
Viu um pedaço queimado, seco, acabado, jogado. Não sabia o que era, chutou. A coisa gemeu. Assustou-se, correu, parou, voltou, cutucou com o pé. Nada... Então, chutou longe. Um grito acompanhou o vôo. Assustado correu, o mais que pode. Ao longe parou, peito arfando, coração disparado e,não resistindo, mais uma vez voltou, procurando pelo chão. Andou bastante até que escutou o gemido. Foi atrás com medo, mas foi, devagar. Viu a coisa, quieta, no chão. Parou ao lado “geme agora, geme!”. Silencio. Abaixou-se para ver melhor e foi chegando cada vez mais perto. Uma coisica de nada! Perdeu o medo. Cutucou com o dedo, pegou, entre o polegar e o indicador. Foi então que a coisa soltou uma labareda e gritou. Ele também gritou, largou a coisa, os dois dedos pegando fogo, tentou apagar socorro, socorro, os dedos queimando, correu, mas como correu!!! Quando conta ninguém acredita nem quando como prova, ele mostra o polegar esturricado.
Por Gabriela
Tenho reentrâncias e cavidades. E elas suam. Às bicas.
Me sinto pegajosa, e minha pele é só um esturricado difícil de percorrer.
Procuro não me mexer pra não gastar energia. Procuro não respirar.
Procuro um sopro de ar que não esteja mais quente que a sopa em que se transformaram meus neurônios.
Um peixe jogado pra fora do aquário, a imagem que me vem.
Mas não me debato, não consigo.
Abro e fecho a boca, sem parar. Rápido, lento. Até parar de respirar.
Por Mariângela
Enquanto eu me queimo de raiva,
dou socos no ar e deixo esturricar meu humor,
ela permanece intacta, com uma brancura irritante
e uma calma que me intriga.
Vive na superfície, porque eu é que sou o submundo,
o avesso em pêlo, que me desisto por dentro.
Devo a ela minha vida, o dar certo todo dia,
o acordar e achar alguma graça,
acreditando que tudo vai mudar.
É a ela que me submeto, adoro e venero.
É ela que me aceita e me tolera.
É ela, só ela.... minha infinita paciência.